15 de março de 2011

Consciência Cega - Livro inédito de contos e crônicas de Hermes Machado

Consciência Cega é o novo livro escrito pelo autor Hermes Machado, na verdade trata-se de uma coletânea de contos e crônicas inéditas alinhavadas ao tema educação nas escolas e universidades brasileiras. A relação alunos versus professor, pais versus mestres e filhos versus pais é o fio condutor desse trabalho literário que ainda traz como complemento temas que abordam a relação consumidor versus vendedor no comércio e justiça versus crime na relação de poder. O livro inédito está registrado no Escritório de Direitos Autorais sob nº. 483.168 livro 912 folha 111 em 12 Janeiro de 2010. Os textos relacionados abaixo neste blog são parte integrante do livro de contos e crônicas intitulado Consciência Cega. O autor estuda propostas para edição e publicação impressa.

http://literaturahermesmachado.blogspot.com

hermesmachado_escritor@hotmail.com

8 de fevereiro de 2009

Destino dos Desprezados

O prédio estava decaído. Destoava do propósito do qual servia, dado a depreciação diagnosticada pela depredação. No portão de entrada, dois soldados em uma viatura de policia defendiam as pessoas que concorriam pela convivência naquele lugar. As grades de ferro nas várias janelas destacadas na fachada do pavilhão denunciava a desconfiança e o descrédito nos transeuntes que passavam pelo local. Havia buracos nas vidraças, mas não de rombos deflagradas por pedradas. Furos precisos não deixavam dúvidas. Deduzia-se pelos vestígios, marcas de projéteis disparados por armas de diferentes calibres. As paredes que davam aspecto e identidade aquela instituição estavam vestido
de cor desbotada pelo descaso e pichadas pelos filhos da desordem que compartilhavam aquele espaço, refletindo a educação a dispor de pais descompassados com o dever primário de civilidade, incumbido a esses cidadãos, garantido pela constituição brasileira. Por trás dos muros, doravante entre 1300 desapontados, incluiam-se educadores, educandos, técnicos e auxiliares da administração diligenciando para garantir a integração social e o direito à grade curricular dos ensinos fundamental e médio, contudo desajustada aos desígnios de tempos difíceis. É noite, final de expediente. Na sala dos professores entre um café e apontamentos de matérias para as aulas do dia seguinte, uma discussão entre docentes do ensino médio principia-se.
“E aí Mateus, você decidiu que medida tomará com o Gledson?”, desejava saber a jovem professora de história sobre a decisão que o professor de matemática tomaria em relação ao baixo rendimento escolar do aluno citado.
“Não tem jeito, Helena. A ordem vem de cima. Tenho de fazer vistas grossas e cumprir o que está determinado. Esse é mais um que vou promover para a próxima etapa. Consciente do crime que comete o experiente mestre, calculista, cumpre a ‘cartilha’ e pouco questiona seus efeitos deletérios sob pena de exclusão da dedicada carreira de magistrar. Conivente, ele aceita o dispositivo estabelecido pela direção da instituição criada para deseducar e formar jovens despreparados para o exercício pleno da cidadania. E assim, contribui com a estatística que norteia a evolução dos índices na educação do país, para desinformados acreditarem. Não é o caso de Helena. Atenta ao despautério que essa distorção resulta à sociedade em profissionais desabilitados, desastrados e perniciosos, ela discorda e justifica:
“Não é assim que formaremos futuros cidadãos, gente que fará valer seus direitos e deveres. Os jovens que enganamos hoje serão os maus profissionais motivados à fraude de toda espécie.”
Ao ouvi-la, já impaciente, Mateus refuta as observações da docente de história:
“Estamos de mãos atadas. Não podemos reprovar nem punir os maus alunos. Como educá-los num ambiente tão hostil, padrão das atuais instituições públicas de educação, apenas com considerações entre pais e mestres? Enquanto me desgasto conscientizando um aluno-problema que não me deixa prosseguir com a aula, recebo insultos, ameaças e deboche dos demais. O aluno não cumpre as tarefas. Se o cobro, eu corro o risco de ser mal interpretado por ele, pelos pais e até pela direção escolar, sempre provida de normas, as quais, devo seguir. Certa vez um amigo escritor me disse: ‘A violência e o dolo nas escolas e outros domínios da sociedade é o destino dos desprezados para haver de serem vistos e ouvidos. Vivemos em um país onde o dinheiro é a déspota divindade. Ao povo desvalido que poupa sua dignidade como única garantia de riqueza, as castas organizadas continuam dispensando ração e distração. A ostentação dos abastados em um Brasil de miseráveis traz dor e cólera.’ Enfim Helena, faço o que me pagam para fazer. E olha que não é pouco. Quem paga os remédios que faço uso para conter minha ansiedade? A escola, a sociedade? Dou duro em três escolas e mal consigo pagar minhas contas.”
Solidária as justificações do professor, todavia ainda abnegada as suas crenças de futuro melhor para a educação no Brasil, resolveu lhe fazer um convite:
“Faremos um mutirão nos próximos quatro finais de semana para deixar a escola mais bonita. Antes, promoveremos um bingo com prendas doadas por comerciantes da associação de bairro e com o dinheiro arrecadado daremos início as reparações. Vamos pintar, trocar vidros e mais o que for preciso para dar distinção a esta construção. Tenho aqui, professor Mateus, uma lista de voluntários que se comprometem a participar. Inclui-se a ela professores, alunos, pais, e pessoal da administração. Então, posso contar com você?

Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com

7 de dezembro de 2008

Virada... Um dia para se esquecer

Meia noite. Ouço estampidos. Vejo fugas de seres desesperados em estado de choque sob fachos de luzes que povoam o céu noturno. Agoniados, buscam abrigo debaixo de carros, ou para os fundos das casas; seus corações palpitam prestes a saírem pelas bocas. Olho para cima e, mais uma vez, vejo desalento. Outros, irracionais; desta vez, os alados em vôos desvairados fogem para a serra num ato não menos trágico em busca de quem sabe, livrar-se do inferno criado racionalmente pelo homem para deleite dos próprios homens com o intento de brindarem a virada. A virada? A virada do que? De repente em meio à multidão que aflue de todos os cantos almejando o melhor lugar ao redor das toneladas de pólvoras fincadas sob a areia observo e ouço gritos, soluços de recém-nascidos, crianças de colo e uivos insanos de pequeninos cães caprichosamente acompanhados de seus pais e pseudo-madames respectivamente. Qual ser, em sã consciência levaria sua prole ou seu animal de estimação para um evento cujo espetáculo principal é a queima de toneladas de bombas em meio ao ensurdecedor barulho? O evento se dá. Uma hora após a passagem de sei lá o que, centenas, talvez milhares de garrafas espalhadas sobre o solo das calçadas, gramados, orla da praia; muitas, espatifadas espalhando cacos por todo o lado, apenas para satisfazer os "mentecaptos" do som que estas produzem quando estouram pelo chão.
Conheça o Clã Tribo das Letras! Lá você encontrará pequenos trechos de obras consagradas e quem sabe, a partir daí, sentir-se incentivado à leitura de bons livros.

Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com

19 de julho de 2008

DESPEDIDA ANTES DA HORA

Lá estava Amâncio Carrasco com seu cão. Ele que adotara por preceito fazer parte daqueles que levados pela compaixão tinha por hábito premiar com a adoção cachorros abandonados nas ruas, de porte grande e com idade avançada. Neste caso, pensava ele, por conta da não preferência para esses cães, dado o custo para alimenta-los, a sujeira que estes produzem com suas abastadas fezes e xixis, e espaço físico para mante-los livres das correntes. Contrariado, lá estava ele acompanhado de seu bichinho de estimação, desta vez, um cão da raça Dobermann aos seus olhos, visto que para os médicos que o avaliaram, prescreveram no prontuário do animal se tratar da raça S.R.D.
– S.R.D. são eles – sentenciou Carrasco, ante a maledicente sigla para: sem raça definida. Estando com aproximadamente nove anos de vida sendo três sob a tutela de Amâncio, Apolo tinha porte e aparentava altivez apesar de, na ocasião, com dores mancava do membro posterior direito. Já, no consultório da clínica veterinária apossado de laudos, raios-x e caixas de remédios, seu tutor precisou tomar uma difícil decisão. Ante o exposto pela doutora, diagnóstico de ostossarcoma canino, a ele lhe restava duas saídas: Na primeira, amputação do membro posterior direito, visitas indispensáveis à clínica para sessões quimioterápicas bem como administração constante de remédios via oral sem falar dos custos orçamentários e dos agressivos efeitos colaterais que estas drogas provocariam ao seu cão que lhe dera até então tantas alegrias, proteção para seu lar e dezesseis pontos no pulso direito em uma única ocasião que "o deus grego do mundo cão" lhe ladrou assim que adentrava a casa carregando algumas latas de carnes para dito, filho de pêlo, em um dia que precisou fazer horas-extras no trabalho e chegou de volta a casa em horário não costumeiro. Na segunda saída, bem, esta lhe pareceu mais sensata. Vendo que na primeira hipótese, o sofrimento do animal e de sua família se estenderia por mais algum tempo ao lado de um cão condenado que em nome da “ciência experimental dos doutores de faz de conta, muitas vezes, manufaturadores de exames, biópsias, cirurgias que deveras só trazem sobrevida aos seus bolsos já empanturrados de ganho ilícito as custas do ludíbrio daqueles que sofrem por quererem a qualquer preço salvar seus entes irracionais”, precisou ainda, ouvir da médica chefa acompanhada de seis residentes, todos vestidos da mais cândida cor a garantia de melhor qualidade de sobrevida para o pé na cova, ou melhor, pata na cova. Num profundo suspiro de pesar e vendo que os sete anjos os observavam gélidos esperando sua decisão, Carrasco abraçou ternamente seu cão, beijou-lhe o focinho e acompanhado-o até a sala reservada para eutanásia ficou ao seu lado até que tudo se desse por consumado.
Hermes Machado é autor do romance Vitória na XXV.
Conheça trechos da obra acessando:

Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com

ESCOLA PÚBLICA MARTÍRIO DOS MESTRES

A campainha anunciando a entrada dos alunos da escola pública Martírio dos Mestres, toca. Em tropa, a 8ª. Cavalaria do regimento de infantes avança desenfreada em gargalo, porta adentro da sala que lhe fora destacada. Ainda no funil, passadas maliciosas de mãos, puxões de cabelos, safanões, tapas, e chutes são desferidos em meio ao torvelinho. Ao ocuparem a sala de aula a bandeira da permissividade é desfraldada por alguns que sem noção de direito e civilidade comprometem o desejo daqueles que se esmeram em busca das qualificações mínimas e necessárias para se relacionarem em grupo.
Entre os ordinários um deles se destaca: Marcelo Tornado, um jovem rapaz intragável que usa da avantajada compleição física e personalidade atroz para impor seus desejos nocivos sobre aqueles que escolhe a dedo para serem suas vítimas do que hoje costumeiramente chamam de bullying. Entre as vítimas desta vez, pasmem, não está este ou aquele aluno cujo perfil denota comportamento exemplar ou comprometimento com os estudos. A “bola da vez” é o professor. Ante a confusão generalizada na classe Célia Mormaço encoraja-se: – Bom dia! – enquanto poucos lhe dão boas vindas, a maioria dentre os demais a ignora. O dia é realmente abafado. O sol irradia a luz por entre os vidros das janelas que compõe aquele espaço destinado a educação. Súbito Cida Vendaval levanta-se da carteira onde está posicionada e dirige-se ao interruptor que faz funcionar o ventilador contendo três pás em forma de hélice. Aciona-o. Enquanto isso, Mormaço tenta conter a balbúrdia. Neste mesmo instante, aproveitando-se da distração da já apoquentada instrutora de língua portuguesa, Tornado arremessa um estojo de acrílico contra o aparelho de ventilar que gira na velocidade máxima. Ouve-se um estampido. Estilhaços do que era um estojo de lápis, apontador, borracha e canetas se espalham por todos os lados do reduto. Para sorte dos alunos, apesar do susto, ninguém se fere. Ao ver a cena que se segue com gritos e xingamentos da parte de alguns alunos contra o vândalo, Mormaço não querendo atrair para si a animosidade de Marcelo Tornado põe “panos quentes”, afinal é de seu feitio e ela sabe que não se deve correr riscos com um aluno mentecapto. Os tempos mudaram, os dispositivos legais é que não parecem acompanhar o ritmo tendencioso da desordem. Assim, alinhando-se ao sistema, Célia Mormaço, desorientada como quem pede uma trégua, ergue em punhos o estandarte da conivência. A aula enfim, aos solavancos começa. Ela sobrescreve a matéria no veterano quadro negro que é previamente dividido em três partes com riscado de giz. Empunhando o bastonete de greda como arma para conter a bagunça na sala, Mormaço dispara a escrever compulsivamente preenchendo em poucos minutos as três páginas da lousa, que são apagadas e reescritas sucessivamente por intermináveis cinqüenta minutos até que sua obrigação naquela classe se dê por encerrada.
Dever cumprido recolhe a caixa de giz, a caneta vermelha, o material didático e com o calor humano que lhe é peculiar, leva-os ao peito, abraçando-os carinhosamente. Quando se prepara para sair, já na porta é surpreendida por Marcelo Tornado. Enquanto ele a distrai com desculpas, Marco Carrasco, seu comparsa nas sabotagens aproxima-se detrás da professora com um isqueiro e acionando-o, ateia fogo no cabelo dela. – Que fumaça é essa saindo da senhora? – Cínico, Tornado questiona-a com sinal de espanto. Tomada pelo desespero Célia Mormaço grita sentindo o ardor das chamuscas em sua cabeça no tempo em que Cida Vendaval a largos sopros tenta extinguir já, as brasas. A diretora, a coordenadora, a merendeira, o inspetor, os professores e alunos, todos que partilham do suposto auspicioso lar da educação, tomam conhecimento do caso. Resultado: Célia Mormaço é transferida de escola, pois a direção entendeu que não era seguro para ela continuar naquele local. Após o episódio, a reputação de Mormaço perante os que presenciaram o incidente era de total escárnio naquela contemplada entidade do saber, Escola Pública Martírio dos Mestres.
Hermes Machado é escritor e autor do romance “Vitória na XXV”
Conheça trechos da obra acessando:
Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com

PRATO FEITO OU À LA CARTE

Em um pequeno lugarejo pertencente às terras habitadas pelos tupiniquins dois jovens cresciam, à medida que gozavam da educação dada por seus pais; cada qual desses brasileirinhos, de acordo com os hábitos de suas respectivas famílias. Ocorre que apesar de se terem ambas as famílias condições financeiras similares, o modo pelo qual educavam seus filhos era deveras um tanto quanto distinto. Jô, filho de José das Pedras e Maria Costura, fora educado desde a tenra infância ao hábito salutar da leitura. José das Pedras, homem rude pela falta de formação educacional e desgastado pelo trabalho braçal não desejando o mesmo futuro para o filho encarregava-se de adquirir literaturas infantis em um acanhado sebo naquela localidade, para então, de posse das diminutas fábulas, serem lidas por ele ou pela esposa Maria na presença do filho sempre que este ia dormir. Passados alguns anos e freqüentando a escola, Jô via inestimável prazer nos livros e assim maravilhava-se com incontáveis títulos e assuntos que ao serem retirados da biblioteca por empréstimo lhe saciavam a sua sede pelo saber. Já na casa de Krelson, filho de Fausto e Ana Maria, tal gosto pela leitura não vingou, uma vez que seu pai só se interessava por futebol e a mãe por assuntos relacionados à culinária. À medida que Krelson ia crescendo, tão logo retornava das aulas que assistia na escola devotava seu tempo de folga na sala de tv, consumindo cultura no formato “prato feito” fosse como fosse adquirindo a mesma informação que outros milhões de telespectadores estavam vendo. Ao contrário do que se possa raciocinar o atual modelo televisivo ainda é produzido para não fazer pensar, uma vez que é veloz e massificado chegando ao despautério de extenuar àquele que lhe devota seu tempo. De outra forma, quando não era atraído pelos desejos visuais da tv era traído pelo desperdício de tempo que dispendia navegando por salas de bate papo na Rede Mundial de Computadores. Com o passar dos anos Krelson se distanciou do relacionamento intimista que havia entre ele e seus pais, todavia porque achava que as fontes de conhecimentos deles estavam superadas e caducadas. Com o novo vocabulário que lhe agregava comunicabilidade nas salas de bate papo somados a linguagem adquirida na roda estudantil de colegas de mesma afinidade, Krelson distanciou-se de vez dos pais, passando grande parte do tempo entocado em seu quarto em companhia das músicas, cujas letras agregavam péssimo mau gosto daqueles que as escreviam e cujo ritmo era de alto poder alucinógeno, contudo para aliciar as mentes incautas. O mesmo não ocorreu com o desenvolvimento intelectual de Jô. Tão logo terminava seus deveres escolares e enquanto estava livre dessas obrigações dispunha tempo em algum momento do dia para leitura de escritores consagrados, tanto dos brasileiros quanto dos estrangeiros. Já nesta fase seus pais o incentivavam a debates que realizavam quinzenalmente dentro de casa. Nesta ocasião, era um privilégio para Jô resumir e tirar suas conclusões, sobre o livro que havia lido, na presença deles. A relação de Jô com seus pais tomava consistência, deveras pelo laço criado lá nos tempos de sua meninice quando os pais lhe contavam historinhas para dormir. Quem possui livros, jamais vive só. A literatura molda aquele que se predispõe a discorrer sobre cada palavra escrita contida no livro fazendo-lhe refletir e recriar uma nova história, a sua história. Não demorou muito para seus pais notarem a independência interpretativa de Jô que lhe dava pleno discernimento para as escolhas “à la carte” que lhe agregavam valores de toda sorte e seguir na vida autonomamente em busca de seus objetivos. O tempo correu para ambos os jovens tupiniquins e o final desta história... Bem o que importa aqui é a reflexão e a recriação de uma nova história em cada lar brasileiro, portanto o que estamos oferecendo aos nossos filhos? Prato feito ou à la carte?
Hermes Machado é escritor e autor do romance “Vitória na XXV”
Conheça trechos da obra acessando:
Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com

A SENHA PARA SABOREAR O BOLO

Ainda morando na casa de seus pais, o jovem rapaz apelidado por Thom, quando se preparava para ir dormir em seu quarto notou seu pai entretido com um novo título de livro, desta vez, “O Príncipe de Nicolau Maquiavel”. Naquele dia Thom resolveu perguntar ao seu pai, Normando Castelo, algo que lhe perturbava: Qual era a importância dada por ele à leitura de tantos livros? A resposta do pai lhe sobreveio de pronto:
A leitura desses livros, sobretudo os de literatura, leva-me para lugares que não teria condições de conhecer de outra forma. É nesses livros que viajo aos confins da terra. Posso voltar ao passado e observar com os olhos da mente cada passo da heroína Joana D’arc em sua saga em prol da liberdade da França, posso acompanhar as batalhas do grande guerreiro grego Acquiles contra os troianos, posso enfim, através dos livros ter consciência dos erros e acertos dos homens e com isso estar prudente quanto aos meus próprios passos no decorrer da vida que me é reservada.
Também posso lhe afirmar meu filho que é nos livros que tenho os mais vastos conhecimentos sobre assuntos que envolvem as carreiras profissionais mais diversas, sejam elas nos campos da economia, justiça, política, indústria, comércio, guerra, religião e assim consigo dar boa interpretação dos códigos de linguagem usados por esses profissionais dos mais diversos setores da sociedade. – Não entendendo muito bem o que seu pai quis dizer com referência aos códigos de linguagem, seu filho indagou?
O que o senhor quer me dizer com isso pai? Por acaso há alguma relação com palavras técnicas usadas em um meio profissional? – Percebendo o interesse do
Filho, Normando Castelo lhe apresentou um romance que já havia lido outrora:
Veja o quão interessante é este romance meu filho; a história trata do envolvimento de uma filha e do suposto namorado na autoria da morte de seus pais para obter de maneira sórdida a herança. Aqui, nesse romance, através das letras e linhas impressas em unidades de pensamentos formando uma engenhosa teia de idéias relacionadas é possível, à medida que se lê, acompanhar de camarote, de maneira tal como um privilegiado expectador, cada passo arquitetado, pela filha e seu namorado na prática de um crime bárbaro.
Também é possível observar o meticuloso trabalho de policiais e peritos no encalço de provas que possam incriminar possíveis suspeitos. Por fim, o complexo jogo de xadrez onde de um lado do tabuleiro se encontra o promotor, representando a vítima e do outro o defensor dos supostos autores do crime. Cada um desses exímios artistas do pensar, munidos de perícias, resultante do exercício contínuo de leituras e releituras de milhares de laudas processuais que lhes trazem suporte para mais uma envolvente batalha judicial. Desta forma filho, o que quero lhe mostrar é que a leitura de modo geral, seja ela provinda de um artigo de jornal ou revista, de um gibi ou de uma história infanto-juvenil acresce valores indispensáveis na formação dos nossos modos de pensar quanto as possíveis interpretações que daremos sobre o mundo e a vida, não obstante vivenciada nos livros.
Infelizmente vivemos em uma sociedade desinteressada pelo indispensável hábito da leitura e isso se dá, sobretudo nas classes desfavorecidas onde justamente esta consciência favorável à leitura seria a chave certa que abriria as portas do saber para o melhor posicionamento social, educacional e profissional. – concluiu o pai.
 Pensativo, thom perguntou: Se é este o caminho, por que falta interesse nas famílias de modo geral pelo bom gosto das leituras de qualidade?
– Isto como dizia seu avô, meu filho, são outros quinhentos! O que posso lhe adiantar é que vivemos numa sociedade capitalista. As regras do jogo são determinadas por quem está no poder, sempre alicerçando o controle nas mãos da elite pensante.
É muito fácil manter o poder quando se tem uma população desinformada, desinteressada, desestruturada socialmente, marginalizada e segregada. Informação é poder. O bolo é grande e delicioso. Há muitas pessoas na festa. Elas são empanturradas com balinhas, docinhos e salgadinhos, mas o bolo... Este, por enquanto, ainda é repartido entre poucos privilegiados. Portanto meu filho, se você quer saborear o que há de melhor na festa e se posso sugerir, sobretudo aos jovens, qual é a senha para ter o direito de saborear o bolo, minha sugestão é:
Vá consumindo sem demora, as estórias dos livros que estão se corroendo por traças nas estantes abarrotadas das bibliotecas públicas, por falta de uso ou nos porões de suas casas. Devore-os e você certamente encontrará a senha, quem sabe no mais roto dos livros.

Hermes Machado é escritor paulistano que vive na Baixada Santista. Antes de iniciar a carreira literária atuou como guia para congressos nos Estados Unidos, foi executivo de empresas e gestor de negócio próprio. É autor do romance Vitória na XXV, possui contos e crônicas em sites e jornais impressos no Brasil e exterior.

http://literaturahermesmachado.blogspot.com


hermesmachado_escritor@hotmail.com

QUANTO VALE UM FREGUÊS

Quando adentrou a loja de roupas no centro de uma cidade considerada pólo comercial de grande importância naquela região, Joana foi solicitada por uma atendente que aguardasse por alguns minutos até que o gerente daquela conceituada loja de confecções lhe pudesse atender, e finalmente dar-lhe a oportunidade de apresentar o mostruário de produtos que ela trazia numa elegante mala de couro e que naquela ocasião representava para uma grande fábrica de moda íntima feminina. Enquanto esperava, Joana notou que uma das vendedoras da loja discutia com uma freguesa insatisfeita, que após não conseguir o que queria acabou saindo colerizada daquele estabelecimento. Mal acabara de sair a referida potencial compradora e a malvada vendedora comentava para uma outra: “não vou perder meu tempo com uma freguesa de R$ 19,90 e trazer todo o estoque da loja para ver se ela acha o que quer”. – É caroço! – a indolente vendedora sentenciou sem dó aquela freguesa. Joana observou-a atentamente enquanto a cena ficava indo e voltando como que revirando em sua mente. Naquele instante pensou: Quanto vale um freguês? Sempre, Joana se convencera de que não se devia ver um freguês pelo que ele poderia estar comprando hoje, mas pelo que ele viria comprar ao longo de um ano. - Afinal: o lucro não seria o resultado de vários negócios repetidos? E o freguês; O que de fato faz com que ele retorne a uma mesma loja para comprar? – raciocinava a experiente Joana na arte de vender. Ela ainda acredita que a melhor maneira de se fazer com que os fregueses voltem é atendê-los amigável e cortesmente. Muitas vezes as primeiras vendas podem não significar grandes incentivos. - "Que tal encarar os gastos potenciais dos fregueses e não apenas a compra que fizeram hoje? Veja as coisas não como são, mas sim como poderão vir a ser. Lembre-se: a grande missão de um vendedor é satisfazer a necessidade de quem procura comprar e isto só poderá ser feito se houver comprometimento profissional com a necessidade daquele que salvaguardará seu soldo mensal" – palavras de Joana!

Hermes Machado é autor do romance Vitória na XXV.

Conheça trechos da obra acessando:
http://literaturahermesmachado.blogspot.com

Email: hermesmachado_escritor@hotmail.com